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voltarA nova realidade do Lucro Presumido
Legislação enfraquece a máxima “donos ricos, empresas pobres”
Com a entrega obrigatória da Escrituração Contábil Digital (ECD) referente ao exercício de 2014, as empresas tributadas pelo Lucro Presumido que não cumprirem os preceitos legais sobre a distribuição de dividendos aos seus sócios e acionistas estarão muito mais expostas a autuações do fisco a partir deste ano.
A Lei 12.973/14, agregada à Instrução Normativa 1515/14 e demais regulamentações, deve dificultar práticas como a distribuição de lucros além do permitido, com a inclusão nesses valores não tributáveis de recursos captados em instituições financeiras e, até mesmo, receitas operacionais antecipadas por manobras contábeis mesclando os regimes de caixa e competência.
Segundo os novos dispositivos, não estão sujeitos ao imposto sobre a renda os lucros e dividendos pagos ou creditados a sócios e acionistas de pessoa jurídica tributada com base no lucro presumido ou arbitrado, desde que:
a) o valor não supere a base de cálculo do imposto, diminuída de todos os impostos e contribuições a que estiver sujeita a pessoa jurídica;
b) a parcela de lucros ou dividendos excedentes ao valor determinado no item a, desde que a empresa demonstre, através de escrituração contábil feita com observância da lei comercial, que o lucro efetivo é maior que o determinado segundo as normas para apuração da base de cálculo do imposto pela qual houver optado
Na verdade, mantém-se inalterado o previsto no art. 48 da Instrução Normativa nº 93 da Secretaria da Receita Federal, de 1997, quanto à distribuição de lucros sem a incidência de impostos, abrangendo:
a) o valor do lucro presumido (base de cálculo do imposto), diminuído do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica – IRPJ, da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido – CSLL, da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – COFINS e das contribuições para o PIS/PASEP;
b) a parcela dos lucros e dividendos excedentes ao valor determinado na alínea "a", desde que a pessoa jurídica demonstre, através de escrituração contábil feita em observância à lei comercial, que o lucro efetivo é maior que o determinado segundo as normas para apuração do lucro presumido.
Ainda segundo essa legislação, “a parcela dos rendimentos pagos ou creditados a sócio ou acionista ou ao titular da pessoa jurídica, a título de lucros ou dividendos distribuídos, ainda que por conta de período de apuração não encerrado, que exceder ao valor apurado com base na escrituração contábil, será imputado aos lucros acumulados ou reservas de lucros de exercícios anteriores, ficando sujeita à incidência do Imposto de Renda Retido na fonte, caso não existam Lucros ou Reservas de Lucros suficientes para sua distribuição, com os respectivos acréscimos legais”.
Na prática, se uma prestadora de serviços quiser distribuir dividendos superiores a 32% de seu faturamento, deduzidos os impostos, deve provar, com base na escrituração contábil, a existência de uma lucratividade acima dessa base de cálculo, que é arbitrada pela Receita Federal para essa modalidade de negócio.
Contudo, são muitas as atuações do fisco e solicitações de consulta envolvendo tal entendimento, sendo emblemático disto um acórdão de 2013, proferido em Curitiba pela Delegacia da Receita Federal de Julgamento (7ª Turma), contra a distribuição de lucro em contabilidade escriturada por regime de competência, caso a empresa tenha optado inicialmente pelo regime de caixa.
Apesar de haver certa controvérsia neste ponto, uma vez que as normas do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) impõem o regime de competência, enquanto a legislação fiscal concede ao contribuinte de lucro presumido a opção pelo regime de caixa, um fato parece óbvio: a empresa deve sempre pagar os dividendos pelo mesmo regime com que faz sua escrituração.
Em suma, devem-se adotar as práticas contábeis vigentes no Brasil, e elas emanam do CFC. A lei não desobrigou a adoção do regime de caixa para fins de tributação, porém, é impossível distribuir dividendos sobre um lucro ainda não tributado, convenhamos.
A maior parte destas organizações , por não ser regulada nem ter grande porte, pode optar pela NBCTG-1000 (Contabilidade para pequenas e médias empresas) e fazer ajustes contábeis, sempre que necessário, para pagar dividendos. Deve-se observar, por exemplo, a correta classificação e contabilização das contas a receber, estoques, imobilizado e regime de competência na apropriação das receitas e despesas, independentemente de a opção tributária ter recaído sobre o regime de caixa.
Embora, a princípio, tudo isso possa indicar apenas mais trabalho pela frente, sem dúvida trará benefícios, como a maior facilidade de se obter crédito mediante demonstrações contábeis preparadas com qualidade.
Ao mesmo tempo, cria-se um ambiente de negócios mais justo, pois empresas antes escondidas na ilegalidade para pagar menos impostos e, consequentemente, oferecer preços mais competitivos, forçosamente terão de oficializar suas operações. E quanto mais contribuintes pagarem todos os impostos devidos, maiores serão as chances de uma tributação menor para todos, bem como de se ampliarem os investimentos na área social e o próprio crescimento do Brasil.
Por último, uma contabilidade de acordo com as leis comercias e fiscais torna a empresa mais atraente para ser adquirida, obter investimentos de terceiros e, na pior das hipóteses, estar preparada para uma fiscalização ou recuperação judicial.
(*) Marco Antonio Papini é contador, auditor, sócio-diretor da Map Auditores Independentes e vice-presidente da CPAAI LatinAmerica